26 novembro, 2008

UE e Brasil. Nem que Doha

Via Agência Senado (Marcos Magalhães)

O encalhado acordo


Sérgio Sousa Pinto, no senado brasileiro: «O que se espera do Brasil é determinação, e que não persista na convicção de que nada pode ser feito sem Doha»

: BRASÍLIA A rápida assinatura do acordo de associação comercial entre o Mercosul e a União Europeia seria um "fator de avanço e progresso" nas relações entre os dois blocos, disse nesta terça-feira (25) o eurodeputado português Sérgio Sousa Pinto. Chefe de uma delegação do Parlamento Europeu em visita à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE), ele afirmou que o mundo precisa de uma Europa forte e que a Europa precisa de um Mercosul igualmente forte.

Segundo o eurodeputado português, a União Europeia vê nos integrantes do bloco sul-americano seus "parceiros naturais" na construção de uma nova ordem multipolar. Por isso, "aposta, apoia e acompanha com entusiasmo" o Mercosul. Ele ressaltou ainda a necessidade de que o Brasil, dentro do Mercosul, assuma maior responsabilidade no cenário internacional.

"A União Europeia espera do Brasil os passos que se impõem para a assinatura do acordo de associação. O que se espera do Brasil é determinação, e que não persista na convicção de que nada pode ser feito sem Doha" - afirmou Sousa Pinto, referindo-se à atual rodada de negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC).


Em resposta, o presidente da CRE, senador Heráclito Fortes (DEM-PI), disse ter "pontos-de-vista comuns" com o eurodeputado português e defendeu a realização de um permanente trabalho de diplomacia parlamentar, que, a seu ver, permite um diálogo mais informal entre países e blocos comerciais. Heráclito anunciou ainda a intenção de levar o presidente do Senado, Garibaldi Alves, ao Parlamento Europeu.

A delegação era composta por 11 parlamentares, provenientes de Portugal, França, Alemanha, Espanha, Polónia e Itália. Em um dos momentos mais descontraídos do encontro, Heráclito bateu três vezes em sua mesa de madeira após ouvir uma pergunta da deputada francesa Nathalie Griesbeck, interessada em saber se haveria alguma movimentação política no Brasil para alterar a Constituição, de maneira a permitir a disputa de um terceiro mandato pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

"Esperamos que não haja nenhuma modificação na Constituição. Lula é muito jovem e pode esperar quatro anos, se quiser voltar. Mas ele próprio não alimenta essa possibilidade" - disse Heráclito.

Um dos temas mais frequentes nas perguntas dos parlamentares europeus era o da imigração. Respondendo a uma questão apresentada pelo deputado italiano Donato Veraldi, Heráclito observou que o Brasil é muito orgulhoso da contribuição dos imigrantes à formação do país. Lembrou ainda que ocorreram "problemas pontuais" com a Espanha, em relação ao tratamento oferecido a brasileiros que chegavam a Madrid, mas assegurou que esses problemas foram resolvidos com a ajuda da comissão.

A deputada espanhola Maria Isabel Salinas García quis saber se o Brasil temia um aumento do protecionismo por causa da crise financeira mundial . Em resposta, o senador João Tenório (PSDB-AL) disse que a crise "inexoravelmente" ampliaria os sentimentos protecionistas, apesar dos esforços pela liberalização do comércio mundial.

Ao final da reunião, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) disse considerar a União Europeia um "exemplo notável" para o Mercosul, por permitir aos europeus escolher livremente onde estudar, trabalhar e viver. O senador António Carlos Valadares (PSB-SE) informou que se encontra em elaboração, no governo, um novo anteprojeto de lei para regulamentar a imigração no país. Por sua vez, o senador Romeu Tuma (PTB-SP) agradeceu o apoio do Parlamento Europeu ao processo de criação do Parlamento do Mercosul, do qual faz parte.

20 janeiro, 2008

O "Ponto Crítico" de Notas Verbais. Debater o quê, como e para quê?

Transcreve-se de Notas Verbais:

    "
    Diz o Governo, depois de aprovar a resolução sobre a ratificação do Tratado da UE, que pretende um amplo debate «na sociedade civil» sobre a matéria, com Pedro da Silva Pereira a deixar claro um desejo - o de que a aprovação parlamentar e a ratificação pelo PR «seja tão célere quanto possível e ajustado àquilo que foi a responsabilidade do país na conclusão deste tratado».

    Naturalmente que a responsabilidade na conclusão do tratado cabe em primeira linha ao governo que viu a consciência política aligeirada do fardo de compromissos eleitorais, quando se certificou do apoio do principal partido da oposição e do respaldo presidencial, para se identificar com a "responsabilidade do país", e, identificando-se com esta, geri-la com diferimentos e dispensá-la, porque a dispensou e geriu.

    A desejada celeridade no processo de ratificação é uma questão menor, essa questão do incumprimento do reiterado compromisso eleitoral do PS diz respeito apenas a este partido sendo assunto interno e responsabilidade colectiva que começa no militante politicamente menos pesado e acaba no líder de maior peso – numa democracia há horas próprias para avaliação da responsabilidade do partido em que os eleitores confiaram, dando-lhe o poder. Essa hora ainda não chegou e, democraticamente, a sociedade (a civil, a militar e já agora também a religiosa, a aristocrática e a plebeia, para completar esse tique de tardia manifestação secundária de adolescência constitucional) ditará o que terá a ditar, então sim traduzindo a «responsabilidade do País». Há que aceitar.

    O tratado está feito e assinado, o parlamento vai pela certa aprová-lo e o PR irá ratificá-lo. Perfeito. E tão perfeito que se estranha agora essa consciência de necessidade de debate que o governo manifesta. Mas debate de quê, como e para quê?

    Debater o que está decidido, é perder tempo – e o país precisa de tempo para debater o que ainda não está decidido e não o que já está, ainda para mais o que já está decidido sob invocada responsabilidade do país.

    Além disso, debater como? A legitimidade de um debate funda-se quando ele se centra na formulação de um problema para o qual se busca uma solução – solução consensual se possível, ou com escrutinado apoio maioritário o que já será bom. Politicamente, um debate só é defensável se incidir num problema e não numa solução imperativamente tornada incontornável. E quanto a isto, se não tivesse havido um compromisso eleitoral de debate do problema antes da solução, os canais da democracia representativa seriam suficientes e até aceitáveis por princípio – teria sido melhor o compromisso eleitoral ter sido o deste princípio e com clareza. Não deixar cair uma solução na rua supõe também a responsabilidade de não deixar que o problema na rua se formule.

    Assim, debate sobre o tratado, para quê? Para colocar em espúria oposição à invocada «responsabilidade do país» os que defendendo para a Europa o espírito do tratado e até mais que o tratado, gostariam que o país, em primeira e definitiva vez, fosse responsável na aceitação de mais Europa? Esse exercício com tais objectivos pouco nobres, não só colocam mal os agentes da democracia representativa a quem compete decidir sobre a solução, como também concedem protagonismo aos que integram minorias retrógradas e que são retrógradas porque exactamente são incapazes de formular os problemas ou de aceitar a formulação do problema – o no caso, o problema da Europa – na avidez de algum dia voltarem a ver imposta a solução que as define como minorias ou as confina nas minorias, também elas julgando-se fundadas na «responsabilidade do país» e senhoras de tal responsabilidade.

    Na eventualidade de haver debate de uma solução e não de um problema, esteja certo o ministro Pedro da Silva Pereira que aqueles que pugnam por Europa e mais Europa, todavia fora do quadro de provincianismo português que Pessoa tão bem descreveu – provincianismo mental que parece ser já doença hereditária – esteja certo que esses ficarão em casa. E ficarão em casa porque jamais aceitarão que se chame debate à propaganda ou explicação de solução que fez tábua rasa de compromisso nobre – não estando contra a solução, mas apenas contra a falta de um debate cujo objectivo fosse deixar definitivamente clara a «responsabilidade do país» na solução-Europa para o problema português e na solução-Portugal para o problema europeu, obviamente recusam o desconforto de meramente fazerem propaganda, porque a propaganda nacional, por regra, dá maus resultados em Portugal.

    Como voltaria Pessoa a observar, o provincianismo consiste em pertencer a uma civilização sem tomar parte no desenvolvimento superior dela – em segui-la pois mimeticamente, com uma subordinação inconsciente e feliz.

    Carlos Albino