07 outubro, 2004

Turquia. Quem diz NÃO.

De C.A.D.. eis o texto que abre a polémica aqui.
«As recentes declarações do Presidente Francês, Jaques Chirac, sobre a realização de um referendo no seu país para confirmar (ou não) a entrada da Turquia na União Europeia, são o culminar de uma série de dúvidas que têm sido colocadas aos membros da União Europeia após o pedido de adesão feito pelo governo de Ankara. O Presidente indigitado da Comissão Europeia, José Barroso, congratulou-se pela decisão francesa e formulou o desejo que outros governos sigam esse exemplo.

«Esta opção torna-se, a meu ver, uma perigosa fuga para a frente encontrada por políticos, incapazes de dizer NÃO aos desejos do governo turco. Propondo um referendo às populações nacionais, os governos conseguem, por um lado, lavar as suas mãos, face aos resultados e passar para os turcos a responsabilidade de fazerem lobby junto das respectivas populações. Por outro lado, colocam-se perante questões de maior importância e para as quais terão que adoptar uma resposta rápida e inequívoca.

«A realizarem-se, qual será a força dos referendos para a adesão da Turquia? Por exemplo, em Portugal, para um referendo ter um carácter vinculativo, este tem que obter uma participação superior a 50% do eleitorado. Se isso não acontecer (e não parece uma opção descabida), qual será a posição governamental?

«Sendo o alargamento uma das matérias onde é exigida a unanimidade das decisões, que ocorrerá quando um dos países (por exemplo, a Grécia ou a parte grega de Chipre) votar contra, exercendo um direito de veto, apesar de um hipotético sim de todos os outros membros. Ficará a candidatura suspensa?

«Ou será aplicada a regra da maioria simples ou da maioria qualificada? Será que estas duas simples questões não fazem, por si só, pensar que a questão de referendos nacionais não é a opção correcta.

«Se até hoje jamais se fizeram referendos (ao nível da União) para a entrada de novos membros, porque será a Turquia o primeiro país a necessitar desta “aprovação”? Porque a Turquia é um país especial cujo espírito nada tem a ver com a construção europeia.

«Todos os governos sabem disso, mas por um motivo ou por outro, não conseguem explicar às suas opiniões públicas como se pode fechar a porta da prosperidade europeia àquele país. Como decerto já se compreendeu, sou contra a entrada da Turquia na União Europeia. Como está a ser pensada hoje, a União Europeia será, no futuro, um super-estado (quer se concorde ou não), onde as maiores e mais importantes decisões serão tomadas em Bruxelas (mesmo que para isso seja necessário construir uma União a várias velocidades). Ora para que as decisões sejam aceites é necessário haver uma base comum que vai muito para além das vantagens financeiras.

«Não falo da base religiosa que é, a meu ver, o grande receio dos países ocidentais e o último argumento que pode ser utilizado neste tipo de discussão. Devemos falar sim (entre outros) de critérios culturais, geográficos e políticos.

«Ao nível cultural, a Turquia é herdeira do Império Otomano, nada tendo a ver com os países ocidentais que são, na sua esmagadora maioria, herdeiros do Império Romano e/ou do Sacro Império Romano-Germânico.

«Ao nível geográfico, apenas uma pequena parte da Turquia está realmente na Europa. Por muito que os turcos se sintam europeus, o critério geográfico é importante pois, caso não fosse observado, poderiamos ter que conviver com uma candidatura neo-zelandesa ou australiana, países cultural e políticamente muito mais próximos da União.

«Em termos políticos, apesar dos inúmeros esforços dos sucessivos governos turcos, o país não é uma democracia do tipo ocidental. A “democracia” foi criada artificialmente após a queda do Sultão. Não existe uma cultura democrática do voto e da força das leis. Por exemplo, enquanto nos países ocidentais as instituições ( “as instituições funcionam”) são a garantia do funcionamento da democracia, enquanto na Turquia esse papel é desempenhado pelas forças armadas.

«Ao nível dos direitos humanos e, mais uma vez reforçando os excelentes progressos, a Turquia ainda deixa muito a desejar para um país que procura entrar para uma comunidade de respeito por esses direitos como é a União Europeia.

«Resumindo, temos que ter a coragem de dizer NÃO e explicar o porquê desse não para que o argumento religioso, sempre o caminho mais fácil para as questões, não se sobreponha a diversas razões que são da maior importância.

Gostaria de saber a sua opinião (de Notas Verbais…) sobre este assunto, que eu considero de maior importância para o futuro da União Europeia.

C.A.D. »

1 comentário:

Anónimo disse...

Há muitas diferenças entre a Turquia e qualquer país da Europa. Como há diferenças entre quaisquer dois países da Europa.
Eu apoio entusiasticamente a entrada da Turquia na UE (enquanto esta existir) pelas seguintes razões:
a) Negar a entrada da Turquia na UE é uma prenda ao fundamentalismo islâmico. A probabilidade da Turquia, fora da UE, virar estado mais ou menos islâmico é muito forte. E isso traria a fronteira do fundamentalismo para dentro da Europa exercendo pressões terríveis nalguns estados balcânicos de maioria muçulmana (Bósnia, Albania, etc.). Negar a entrada da Turquia é um erro estratégico.
b) A Turquia viria equilibrar os poderes dentro da UE. Actualmente o poder da dupla França-Alemanha (a que se quer juntar a Espanha) desiquilibra toda a UE. Com a Turquia (que a curto prazo terá uma população superior à Alemanha) o edifício europeu equilibrava-se e tornava-se mais hatmonioso. Em particular, quer franceses quer alemães passariam a ter o interesse estratégico de distribuir mais o poder pelos mais pequenos de forma a evitar a hegemonia turca.

Quanto à Turquia estar fora da Europa é um argumento sem valor, Chipre está na UE e dificilmente se pode considerar na Europa, a Guiana francesa está na UE e é um território sul-americano. As próprias ilhas da Madeira e das Canárias estão mais em África do que na Europa, etc.

Portanto, no nosso próprio interesse, devemos apoiar a entrada da Turquia na UE logo que possível.